Em Alta Velocidade no deserto

Em alta velocidade no deserto!

Liliene Santana / Fotos Arquivos: Paulo Amato

21.07.2014

NPC Notícias: Há quanto tempo você participa de rally?

Paulo: Estou envolvido com rally de velocidade a 10 anos, e tenho outros 8 anos antes disso envolvidos com o regularidade. Nesses anos, além de competir fui organizador da Copa Peugeot de rally de velocidade entre 2007 e 2012, o que me trouxe uma experiência fantástica.

NPC Notícias: Qual o motivo da sua participação e objetivo?

Paulo: Infelizmente, mais de 90% dos competidores do Rally hoje em dia pratica por pura diversão. Competimos a nível profissional, com carros cada vez mais profissionais mas ainda bancados por investimentos próprios, e meu caso hoje não é diferente disso. Com o passar dos anos a gente passa a se tornar mais competitivo e esse ano pela primeira vez vou ao Rally dos Sertões com condições de disputar a vitória na minha categoria, porém todos sabemos que não é o maior dos objetivos. Antes de mais nada, todos que largam em Goiânia ( cidade que vem sediando a largada a muitos anos, com exceção de 2012 que iniciou-se em São Luiz - MA) desejam chegar ao final do rally, que este ano é em Belo Horizonte. Essa é nossa maior motivação, até porque sabemos que geralmente metade dos que largam, não costumam concluir a prova, ou seja, chegar já é uma vitória.

NPC Notícias: Podemos dizer que é uma competição suicida?

Paulo: Jamais. O rally é como a vida, precisa de planejamento e preparação. Em qualquer coisa que você fizer na vida, se não tiver cuidado com esse dois "detalhes" terá grandes chances de não ter sucesso. O Sertões é uma das provas mais desafiadoras do automobilismo nacional sem dúvida. Em média são 10 dias de competição atravessando as áreas mais inóspitas do país e andando o mais rápido possível em locais onde, dificilmente alguém escolheria passear devagar, e pra isso Piloto e Navegador precisam estar preparados tecnicamente, fisicamente e psicologicamente. O carro precisa estar preparado para suportar o desgaste excessivo que sofrerá nesses dias sendo usado em condições extremas, e a Equipe de Apoio precisa estar preparada para dar o suporte necessário em qualquer situação. A cada noite o carro é totalmente desmontado e passa por uma avaliação minuciosa dos defeitos apresentados durante a prova do dia e dos desgastes que podem representar quebras futuras. Levando-se em consideração todos esses “pequenos detalhes”, pode-se dizer que é uma prova bem segura, até porque a organização mantém dois helicópteros de resgate UTI em todo o trajeto, mantém dois aviões voando sobre a área de competição durante todo o tempo em que se esta competindo, e isso ajuda a diminuir os riscos e a agilizar os resgates em caso de eventuais acidentes.

O Rally é apaixonante para todos que se envolvem nele. No Sertões a equipe técnica faz um trabalho sacrificante dia a dia, dormindo mal, se alimentando mal, passando o dia todo no sol do Sertão Brasileiro para garantir o sucesso da prova. Uma competição dessas é tão complexa que dificilmente eu conseguiria falar cada função aqui entre médicos, controladores de largada e chegada, equipe de radiocomunicação, helicópteros, aviões, pessoal da cenografia, secretaria de prova locutor, apuradores, diretores de prova, pessoal da Confederação Brasileira de Automobilismo e Motociclismo diretores de equipes de fechamento de trecho, e cada um que fica em algum ponto do trajeto garantindo que as estradas permaneçam fechadas para podermos passar em altíssima velocidade e em segurança. Essas pessoas são sem dúvida a Alma do Rally dos Sertões e fazem isso geralmente apenas por amor ao esporte. Costumo dizer que no Rally dos Sertões existem vários rallys acontecendo em paralelo, e o nosso como competidores é o menor deles. O rally das Equipes técnicas que eu acabei de citar e das Equipes de Apoio dando suporte aos seus competidores é bem mais difícil e complexo que o nosso.

NPC Notícias: Qual a categoria que você irá participar?

Paulo: Esse ano, vou correr na Categoria T2, o que significa dizer que são os carros mais próximos aos carros de rua, com preparação mais limitada. A vantagem dessa categoria é que como as alterações permitidas são muito poucas, os carros acabam ficando mais parecidos e um alto investimento financeiro não traz grandes vantagens ao competidor, nivelando um pouco as maquinas em disputa, e fazendo assim que fatores como estratégia e capacidade de conduzir o carro avaliando riscos e velocidade sejam os diferenciais para a vitória. Ainda assim todos os carros recebem vários e vários reforços na parte estrutural, suspensão, algumas modificações de motorização, pneus, rodas, tanque de combustível extra, além de toda a parte de segurança, com gaiolas de proteção, bancos concha e cintos de segurança de 6 pontos, extintores extras, além de termos que usar macacão, luvas e sapatilhas anti chamas e o protetor de pescoço contra impactos frontais chamado “Hans”.

NPC Notícias: Quantos navegadores irão com você?

Paulo: Cada carro tem um navegador apenas, que não pode ser trocado durante toda a prova. A equipe completa tem mais de 10 pessoas na parte mecânica e de resgates além de piloto e navegador.

NPC Notícias: Qual função de cada membro da equipe?

Paulo: Como eu já disse, o planejamento é fundamental para o sucesso de qualquer função na vida e principalmente de qualquer equipe de automobilismo. Num Rally é sempre mais complexo do que num autódromo por estarmos em ambientes remotos. No Rally dos Sertões isso se agrava ainda pois estamos a cada dia em uma cidade diferente e com recursos locais diferentes, ou seja, temos que nos preparar pra tudo independente de onde estivermos. Esse ano, estamos indo com uma estrutura superdimensionada para tentarmos estar prontos para qualquer situação. Teremos Um Motorhome, um Caminhão de peças, um Guincho Plataforma, e 3 carros de apoio rápido que são os que fazem eventuais resgates caso aconteça alguma pane durante o trajeto de competição. Temos comunicação via satélite em tempo real do nosso carro com nossa equipe de apoio. Para isso tudo funcionar, cada veiculo de apoio rápido ira dispor de um mecânico além do motorista, porque enquanto um dirige o outro dorme e durante a noite enquanto o mecânico trabalha o motorista dorme e se prepara para a próxima jornada. Junto com o motorhome ira nosso chefe de equipe e mais alguns mecânicos. Como somos dois carros de competição, é importante termos pessoal capacitado para desmontar e remontar já consertados os dois carros inteiros durante uma noite caso seja necessário e que na manhã seguinte ambos estejam em perfeito estado para relargarem para a competição

NPC Notícia: Qual o pior percurso?

Paulo: O Pior trecho do Rally dos Sertões costuma ser o deserto do Jalapão que fica entre Tocantins e sul do Maranhão e é uma área de milhares de quilômetros quadrados só de areia, alias a área com menor densidade demográfica do país. Esse trecho costuma ser além do mais difícil pela quantidade de areia fofa, o mais longo, geralmente dois dias seguidos e ainda sem poder fazer a manutenção entre um dia e outro para testar ainda mais máquinas e competidores. Vamos ver o que a organização nos preparou para esse ano. Já é sabido que teremos um trajeto um pouco diferente do habitual, já que a chegada que costuma ser sempre pros lados de Fortaleza, Natal, Salvador, esse ano é em BH, porém sem duvida não será menos desafiador.

NPC Notícias: Quantos dias de competição?

Paulo: A cada ano o rally tem uma configuração diferente, o objetivo é conseguir alinhar todos os interesses envolvidos para a realização de um evento de sucesso e não se tornar repetitivo, sendo assim esse ano teremos 8 dias de provas, sendo um em Goiânia, onde se disputa o Prólogo, que é uma pequena competição em pista fechada de aproximadamente 2 Km para definir a ordem de largada e depois disso mais 7 etapas que vão passar pelas cidades de: Caldas Novas – GO, Catalão – GO, Paracatu – MG, São Francisco – MG, Diamantina – MG ( por dois dias ) e Belo Horizonte – MG.

NPC Notícias: Em 2007 vc sofreu um acidente, o que houve, o que aprendeu com tudo isso?

Paulo: Sim.. em 2007 realmente passei por momentos complicados. Na primeira prova do campeonato Paulista, estreando um carro novo, logo na segunda largada sofri um capotamento a 154 Km/h que me levou para o hospital, porém o mais grave aconteceu com meu navegador Marcio Alonso que me acompanhava desde o primeiro rally de regularidade em 1996. Ele teve algumas fraturas na perna, e seu estado inicial inspirou muitos cuidados, o que foi naquele momento bem traumatizante. Esse fato me fez repensar a segurança de várias competições e foi daí que passei a me dedicar um pouco mais à organização de outras provas, porém não abandonei as disputas e um mês e meio depois desse grave acidente eu tive a oportunidade de voltar a disputar no mesmo local, porém com outro navegador, uma competição da Mitsubishi Cup que acabei vencendo. A vida é feita de desafios, e minha primeira largada pós acidente foi um dos maiores da minha vida, mas quem quer crescer em seja lá o que for precisa aproveitar esses momentos de dificuldade para isso e graças a Deus a vitória logo na sequência e ainda no mesmo local me deu essa grande lição de superação que carrego até hoje em tudo na minha vida.